Tuesday, December 23, 2008

イバラアド - Iblard



Naohisa Inoue é um dos artistas japoneses mais influentes da segunda metade do século XX, autor de um estilo derivado de ilustração e pintura surrealista que se prolonga por uma obra una, estilística e tematicamente. Caracterizado pelo seu uso extraordinário das cores, condizente com algumas veias da pintura oriental, Inoue transporta uma paleta fixa entre diferentes pinturas, retocando com diferentes tonalidades o remate em função da luminosidade preferida para cada momento reproduzido na tela.



O método deste grande surrealista apresenta dois grandes sustentáculos nos quais a sua obra adquire maior originalidade: todos os seus quadros partem de um ensaio impressionista abstracto onde a tela é preenchida com manchas de cores, até que os sombreamentos produzam alguma forma com que Inoue se consiga identificar. Trabalhando profundamente nessas formas, cujos contornos prescindem quase sempre de rigidez, as paisagens oníricas do mundo de Iblard (ver post ~Visions of Iblard~) adquirem um dinamismo vivo e resplandecente; nenhum quadro deste artista se encontra terminado, na medida em que todos eles se encontram sujeitos a alterações, uma forma diferente, quase aberrante no âmbito das artes plásticas, do artista coabitar com a sua própria obra. Ao pintar profusamente sobre uma mesma temática destila-se o desejo de conceber um mundo multifacetado, diversificado, todavia unido por uma ausência de leis físicas, onde os habitantes caminham e voam livremente, fruindo das paisagens intermináveis que nem o próprio horizonte consegue demarcar.


Iblard reflecte de forma marcada o nosso quotidiano, por via de uma incrementação poética da beleza dos conteúdos visuais que nos rodeiam nas paisagens urbanas, complexos industriais e residências. A filosofia de Inoue, expressa numa obra iniciada há várias décadas atrás, realça o prazer inerente a cada espaço, ou o da procura incessante da excelência e gáudio que o artista crê ser omnipresente, se observada através da perspectiva e mentalidade correcta: um trivial jardim no centro de uma grande cidade pode, desta forma, ser o ponto de partida para uma representação do éden.



O impacto deste conjunto de visões deleitosas tem vindo a motivar diversos outros distintos agentes da produção artística nipónica, como o caso do lendário Hayao Miyazaki, que soma três participações distintas com este artista cujas quimeras, embriagadas de cor e de luz, também têm produzido inspirações múltiplas para os conceitos artísticos que suportam diversos jogos de vídeo ao longo dos anos. Tal é o caso do jogo IBARAADO, criado pela TV Asahi e a System Sacom para a Playstation em 1997. Neste título, curiosamente, estabelecem-se inúmeros paralelos entre o mundo original de Inoue e a falsa crónica de viagens de Johnathan Swift em As Viagens de Gulliver, particularmente no capítulo onde o escritor anglo-irlandês descreve um território longínquo denominado Laputa, local caracterizado por transportes e mecanismos anti-gravíticos.


Na qualidade de aventura em primeira pessoa, esta adaptação a cenário de jogo estabelece-se num entorno plenamente tridimensional, onde a escolha cromática e algumas texturas chegam mesmo a recordar o trabalho do pintor japonês – ainda que as potencialidades do hardware não permitissem melhor reprodução da estética envolvente dos seus quadros. No entanto, à parte desta adaptação directa, dezenas de outros jogos de vídeo ou ilustrações dedicadas têm feito utilização das perspectivas e temáticas encontradas nestas telas, nomeadamente a série FINAL FANTASY, PANZER DRAGOON, BATEN KAITOS ou inclusivamente o recente SUPER MARIO GALAXY - os exemplos são, de facto, inumeráveis.

Com o apoio da galeria Art Space, a página oficial de Inoue contém uma galeria compreensiva dos seus quadros, assim como o seu perfil e algumas reflexões sobre a sua arte. A visita deste espaço e a pesquisa sobre este autor é uma imposição para aqueles que desejarem conhecer uma das mais pesadas influências sobre a arte que potencia os jogos de vídeo, assim como uma viagem inolvidável através de um dos universos imaginários mais notáveis de toda a história.

Friday, December 19, 2008

Forgiven, but not forgotten.



Falar acerca de STREET FIGHTER II é, em boa parte, falar de um período ou metodologia dominante na cultura que permeou os jogos de vídeo do romper da década de 90. A eficiência dos controlos e a espectaculosidade das animações foram alguns dos elementos que mais auxiliaram este jogo a tornar-se um dos ícones do seu tempo, ainda que a importância de tais elementos esteja condenada a empalidecer face ao poder do exercício estilístico pelo qual o jogo ainda é recordado e jogado com grande frequência no presente - e decerto continuará a ser jogado, no futuro.

Ao lançar as bases do jogo de combate moderno, a edição THE WORLD WARRIOR progrediu uma longa distância em relação aos demais jogos do seu género, não descurando de algumas grandes referências dos inícios e meados da década de oitenta cuja importância, ainda assim, merece uma atenta reconsideração. Porém este conjunto atraente, caracterizado por um enorme ecletismo no que diz respeito às origens dos lutadores e localizações que serviam de palco ao bailado interactivo de artes marciais superou largamente todos os exemplos prévios, incluindo a primeira tentativa da CAPCOM em 87.


Cerca de uma quinzena após o lançamento deste título de fama colossal, presenciamos mais uma reedição que agora usa do poder comercial da sigla "HD" como introdução ao redesenho (não reestruturação) do esquema original de 91-93. Digna de menção, a retenção dos elementos estilísticos que promoveram o jogo original questiona a própria existência desta nova produção. No entanto, uma observação cuidadosa dos novos e detalhados esboços de personagens, cenários e as suas animações revelará uma particular homenagem a um tom muito característico da edição SUPER.


Não querendo impor um novo ritmo ou conteúdo, talvez apenas um novo ímpeto, SUPER STREET FIGHTER II TURBO HD REMIX deve ser considerado como uma nova impressão artística do tema de jogo, desta feita sob a direcção uma companhia ocidental, a Udon Entertainment, perita em adaptações de alguns dos mais populares mangas para o universo Norte-Americano. Não querendo enveredar por uma crítica acérrima ao resultado final, não posso deixar de pensar o quão mais dinâmica podia ter sido esta investida tivessem os desenhos em alta resolução originado de um estúdio japonês com as competências necessárias. Para além dos visuais, também a componente musical sofreu uma completa remistura que nem sempre é a mais apropriada, por sinal.

Acima de tudo, o jogo em questão propõe dois pontos de discussão que penso serem de relativa importância: trata-se de um exemplo vivo da diferença entre expressão plástica ocidental e oriental, ainda que o tema de base seja invariavelmente nipónico; por outro lado o seu relativo distanciamento permite reflectir sobre a forma como a estética SF desenvolveu profundas raízes na imagem colectiva muitos jogadores formam do conceito de 'jogo de vídeo'.

Thursday, December 18, 2008

Corredor Infinito

Compreendendo vários trabalhos de qualidade, o ano de 2008 revelou-se bastante aprazível no que diz respeito à composição de bandas sonoras originais para jogos de vídeo. Cada vez mais importante no processo de produção de um jogo, esta vertente criativa tem vindo a atrair um número crescente de artistas de renome, facto que tem contribuído significantemente para o incremento da qualidade e diversidade da música no âmbito da indústria vídeo lúdica.

Neste contexto, foram vários os artistas que se destacaram durante os últimos meses: de regresso ao universo de TOMB RAIDER, Troels Brun Folmann e o recém-chegado Colin O’Malley encontraram um ponto de equilíbrio seguro onde a nova aventura de Lara se pôde sustentar; apontando para um épico final de uma das mais conhecidas séries, Harry Gregson-Williams foi responsável por uma considerável parte do dramatismo omnipresente em METAL GEAR SOLID 4: GUNS OF THE PATRIOTS; dando continuidade ao estilo que desenvolveu, Motoi Sakuraba expressou grande sentimentalismo na escrita de alguns temas para INFINITE UNDISCOVERY; e, por fim, como resultado da sua larga experiência, Russel Shaw excede-se a si mesmo na segunda entrega de FABLE, desta feita sozinho e sem o mote de Danny Elfman.

Por entre tão aptos exemplos, gostaria de destacar com maior ênfase o trabalho do compositor Hideki Sakamoto (RYU GA GOTOKU 2, RYU GA GOTOKU KENZAN!, AQUANAUT’S HOLIDAY: INSARETA KIROKU) na criação do acompanhamento sonoro de MUGEN KAIROU (ECHOCHROME), um trabalho realizado no estúdio japonês Noisycroak. Posta a difícil tarefa de uma composição que evadisse o conceito redutor de música de fundo para um dos jogos mais desafiantes dos últimos anos, Sakamoto propõe ao jogador uma lista de temas interpretados no seio íntimo de um quarteto de cordas. Com Hitoshi Konno e Nagisa Kiriyama no primeiro e segundo violino, respectivamente, Kazuo Watanabe na viola e Ayano Kasahara no violoncelo, o grupo faz-se acompanhar ainda da soprano Rumiko Kitazono para a interpretação em estilo operático dos temas iniciais das duas versões deste título lançado para a Playstation 3 e para a Playstation Portable.

No auge da sua experiência lúdica, MUGEN KAIROU ostenta conceitos visuais e geométricos complexos através da simplicidade despojada das linhas negras sobre o branco profundo: a reduzida variação cromática, porém, é compensada por uma riquíssima gama de variações num estilo musical que, apesar da compacta gama instrumental, preenche e ornamenta o espaço de jogo. Suportando a ideia prevalecente da geometria e do rigor matemático, todos os temas possuem o título Prime (ou Primária) seguidos de um número único que os caracteriza – uma forma de manter os temas soltos e sem qualquer associação a um título mais descritivo. Se os volumes tridimensionais bem delineados sugerem grande rigor, a superioridade do poder da perspectiva subjectiva face à veracidade numérica também se encontra adequadamente espelhada através dos temas de Sakamoto, intercalando compassos exactos e constantes com alguns devaneios de maior lirismo.


De forma icónica, esta conjunção específica de género vídeo lúdico com estilo musical erudito encontra um paralelo com uma das primeiras produções da Sony Computer Entertainment japonesa, nomeadamente o clássico KURUSHI, de 1997, que contou com uma grandíloqua banda sonora escrita e orquestrada por Takayuki Hattori. De diferente perfil, a obra de Sakamoto apresenta registos que variam com grande subtileza, bem além do abstracto ou do insensível. Enquanto o tema Prime #59 se manifesta com grande pompa e majestade, Prime #19 e #61 são temas de pendor impressionista que recriam os prazeres implícitos de uma promenade pelos trilhos da descoberta. Algum dramatismo emerge em Prime #2 , #3 e #101, culminando numa expressão de maior romantismo e ímpeto em Prime #9973 – provas definitivas de que não se tratam de composições musicais impassíveis e sem uma alma. A vocalização de alguns temas, de resto, remete para uma clara tentativa de dinamizar uma componente mais humana que existe de facto num jogo aparentemente reduzido a formas poligonais simbólicas.

Desde o ano de 2006, portador da magnum opus de Yutaka Minobe para RULE OF ROSE, que o poder cru das cordas não se fazia ouvir de forma tão pura e cristalina. Hideki Sakamoto atingiu, em pleno, o seu objectivo principal com a criação deste trabalho tão refinado, remetendo a categoria de “música para jogos de vídeo” até novos estilos contemporâneos, com uma elevadíssima qualidade de composição e execução. O facto de ECHOCHROME ser um dos títulos mais notáveis no contexto deste ano em boa parte se deverá ao charme deste singular conjunto de melodias absorventes e emocionantes.

Wednesday, December 10, 2008

歓迎庄野晴彦様樣 (Irashaimasen, Shono-Sama)



É com grande prazer que anuncio a futura entrevista de um dos mais conceituados e premiados artistas multimédia nipónicos, nada menos que Haruhiko Shono, criador de monumentais obras como ALICE - INTERACTIVE MUSEUM e GADGET: INVENTION, TRAVEL & ADVENTURE, títulos que revolucionaram a indústria dos jogos de vídeo e da arte digital no início dos anos 90. O artigo de perfil para o site CoreGamers estará disponível a partir de 2009, após um período de seis meses caracterizado por inúmeras tentativas de entrar em contacto com este visionário cujo estatuto prescinde de apresentações ou adjectivações, bem como na recuperação integral das suas obras interactivas, algumas delas virtualmente inexistentes no mercado actual.

Friday, December 5, 2008

Nanatsu Kaze No Shima Monogatari


Como ávido leitor de revistas de videojogos durante a minha infância, tive a oportunidade de conhecer um universo de títulos bem mais amplo do que aquele que era oferecido pelo reservado mercado em Portugal. Entre dezenas de revistas castelhanas, francesas e brasileiras empilhadas nas prateleiras de minha casa, também se sobrepunham as memórias de jogos inatingíveis segundo o aviso prévio dos afortunados escritores daqueles artigos que eu lia e relia frequentemente. Algures, numa única página entre tantas, figurava um jogo singular cujas imagens me marcaram por alguma razão: talvez pelos desenhos pouco vulgares, ou apenas por uma tendência minha em me concentrar naquilo que não posso ter; tratava-se da Hobby Consolas de Julho de 1997.



Nesta pequena mas enigmática página da secção Big in Japan, o colaborador da Hobby Press identifica o jogo com o título NANATSU NO KAZE NO MONOGATARI, possivelmente uma má transcrição do título original do jogo, NANATSU KAZE NO SHIMA MONOGATARI, traduzido em português, A História da Ilha dos Sete Ventos. Descrevendo-o como um jogo de aventura, o autor do texto também ressalva a invulgar exclusividade deste jogo para uma plataforma SEGA, sendo originário da Givro (Giburo) e da Enix - empresas que criaram a sua reputação em consolas Nintendo. Inocentemente, o personagem principal Gaapu é aqui apelidado de Doctor Gaapu, um de diversos equívocos presentes nos poucos parágrafos que ocupam esta página.

Dez anos após ter conhecimento deste lançamento foi-me concedido o privilégio de o adquirir e experimentar as suas qualidades em primeira mão, facto que justifica a minha apressada tentativa de escrever um texto a seu respeito para o Hardcore Gaming 101 da GameSpy, ciente de toda a expectativa construída ao longo de mais de uma décda. Esta obra rara editada pela Enix é, de facto, um dos jogos mais importantes do seu sistema não só pelo facto de trazer um novo género aos possuidores de consolas SEGA, mas também pelos talentos que se uniram especialmente para a sua criação. O resultado, como defendo no texto do HG101, é um jogo íntegro e surpreendente, de uma beleza visual notável. A simplicidade da sua história e a brevidade dos diálogos em muito adensam o ambiente misterioso desta ilha fictícia e os seus ventos místicos. Fica para breve a publicação no Pixels de uma selecção do soberbo artwork que preenche o disco suplementar do jogo.

Thursday, December 4, 2008

Lack of Love @ Games™


Faço por não manter segredo a minha especial admiração e respeito pelo trabalho revolucionário do artista japonês Kenichi Nishi, o qual tive o prazer de entrevistar no passado mês de Agosto a propósito do seu último jogo NEWTONICA. Ainda que bastante restrito, o grupo de internautas que partilha o gosto pelos jogos de Nishi tem-se demonstrado bastante activo na divulgação de informações: desde o site australiano Eegra até ao blog Love-De-Licious, o número de referências de qualidade vem aumentando nos últimos seis meses, contando também com uma breve entrada do game designer na Wikipédia.

Autor da página Lovedelic Life, Ashley Day escreve um belíssimo artigo sobre LACK OF LOVE na revista Games™ deste mês. Em troca de ter utilizado algumas das minhas screen captures do jogo para a sua composição, Ashley enviou-me uma edição da revista onde pude descobrir que o texto se insere num artigo bastante informativo acerca da história da Dreamcast. Sem surpresas, foi HALO RECON que mereceu o destaque de capa deste número: mesmo assim, cheers Ash!