Saturday, April 5, 2008

Here Be Dragons


Com maior destaque sobre as restantes, a banda sonora de LAIR atinge um expoente máximo da música produzida para acompanhamento de um videojogo no ano de 2007, um trabalho extensivo de John Debney que se reparte por cerca de quatro horas da mais refinada música contemporânea. Configurando-se como uma poderosa investida orquestral, o trabalho deste compositor nomeado para Óscar propõe uma invulgar variedade temática, abrangendo registos distintos porém integrados numa moldura de grande homogeneidade. Como que uma colheita de alguns dos melhores momentos musicais do último século – com especial atenção às bandas sonoras de Hollywood, onde o apurado sentido de Debney se forjou – a música em LAIR encontra-se em rematada sintonia com a temática fantástica do jogo e a sua ampla dimensão espacial. Muito além do épico, a expressão sinfónica que se alia ao prestigioso poder visual desta experiência enuncia como seus principais suportes o trabalho de Basil Poleduris em Conan, The Barbarian, o paradigma da composição musical de temática profana pós Carl Orff, não dessacralizando por completo a redacção melódica, pautada em várias ocasiões por um sentimento venerável popularizado por Miklos Rosza (Ben-Hur, King of Kings).

O corpo de vocalização oscila entre destemidos acometimentos corais, bradando em união, ou a singularidade das escalas de um exotismo médio-oriental, como na suplicação interpretada por Lisbeth Scott em “Ravine of No Return (Darkness)”. Contudo é da instrumentalização que o poder melódico emana, compreendendo um uso incansável da secção de metais, desde a bravura das trompetes à imponência das tubas (Day of Terror – Diviner Battle, Firestorm, etc.), atacando cada nota com uma contundência que inspira fervor heróico. Nas cordas, Debney destila o seu carácter mais exaltado, no auge da sua emoção harmónica e sentida, encontrada no tema “Tutorial” ou em “Firestorm (Elegy)”, com esporádicas transições e encaixes que recordam Fantasy on a Theme by Thomas Tallis, onde Ralph Vaughan-Williams certa vez roçou o divino.

À imagem do jogo que acompanha, a estrondosa obra musical de Debney (ainda) não obteve o reconhecimento absoluto, num caso em que a própria imagem evocada pela linguagem musical subalterniza a majestosa direcção artística do jogo dirigido por Julian Eggebrecht. A sua qualidade parece ter atingido essencialmente os entusiastas da música sinfónica: os poucos que lhe têm reconhecido a sua qualidade intrínseca com os mais enérgicos adjectivos, cenário insólito no domínio videolúdico. Com efeito, o ápex das bandas sonoras originais orquestradas para acompanhamento de um videojogo deste ano concorrido, assim como uma incontestável adenda à afirmação da indústria como importante engrenagem no motor da produção artística actual.


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